CUMBE – EÓLICAS MASSACRE CULTURAL
Valéria Oliveira
É assim, quando alguém tenta ir mais além um pouquinho, imagine esse além, o fundo do quintal da sua casa, local em que costumeiramente se brincava, se congregava, se banhava, onde se pescava! Pois então basta alguém querer ir até o cemitério da comunidade do Cumbe ou ir até uma lagoa, ou até os sítios arqueólogicos, ou ainda até a praia na beira do mar, pra pescar ou apenas tomar o costumeiro banho, hora de lazer, local de brincadeiras de crianca, pois ISSO NÃO PODE!! Os tempos mudaram!?? E o que ocorre? Quem por ventura quiser chegar a qualquer um desses cenários sera impedido, e assim que os membros da comunidade do Cumbe sao recebidos; NÃO PODE! E PROIBIDO! VOLTA! AQUI NÃO PASSA!
Submetidos semanalmente a uma série de constrangimentos! Estudantes de universidades, corpo docente e discente, pesquisadores, historiadores que utilizavam o Cumbe como área de estudos, municipes, cidadãos em geral, pescadores, marisqueiras, artesãos, moradores da localidade, bugueiros que comumente utilizavam esses espaços culturalmente arraigados em suas histórias, perderam, esse direito de ir e de vir, e como!
Há um litígio silencioso, pois que até o momento os profissionais, as pessoas constrangidas e impedidas de transitar na localidade realizando seus trabalhos, lazeres, pesquisas ainda não registraram oficialmente através de um TCO a ocorência do impedimento de seu trânsito em locais até então de livre acesso. E apesar de manifestarem publicamente a insatisfação, fato que por diversas vezes já gerou discussão entre trabalhadores que lá se encontram contratados pela empresa eólica para manter vigilância rígida na localidade, os profissionais que normalmente transitavam pela área, se calam por pensar que podem menos, que a impunidade impera, e que jamais serão respeitados porque nao tem dinheiro, ao contrário das empresas ali instaladas – as famigeradas empresas de energia eólicas, que foram instaladas sem os devidos licenciamentos e sem os estudos de impacto ambiental, ferindo assim a lei magna do país em seu art.225, dentro da unidade de conservacão APA de Canoa Quebrada e que desde os primeiros aerogeradores ali instalados tem gerado vários conflitos sócio ambientais, um dos momentos mais contudentes foi quando a Comunidade do Cumbe impediu por 19 dias o tráfego dos veículos das empresas em atividades, dentro da comunidade.
Ao nosso conhecimento já chegaram três episódios que se sucederam em face de disputa pelo uso do território, nos quais podemos citar que estiveram envolvidos isoladamente a Professora Angela Bandeira, o Historiador Ocivan Moreira e o Especialista em Museologia João Luis Joventino, todos em atividades pedagógicas, tendo este último sendo impedido de conduzir técnicos do SESC Nacional para registrar o cemitério centenário da comunidade do Cumbe.
A incomunicabilidade, o silêncio dos agredidos sutilmente reforça o poderio das empresas agressoras que passo a passo dominam o território e avançam intimidando, impondo, ameaçando, suprimindo o exercício das atividades comunitárias, restringindo os acessos garantidos constitucionalmente, quer pelo exercício da cidadania brasileira, quer pelo status que e dado enquanto população e comunidade tradicional.
Não bastasse a ferida aberta no seio da natureza que ali está exposta, a foz do rio Jaguaribe, seguindo até Canoa quebrada vai perspassando pelos arredores do Cumbe, Beirada e Canavieira onde foram aterradas lagoas interdunares, desmontadas dunas móveis e vegetadas, seccionados lençois freáticos, impermeabilizado quilometros de dunas com adição de argila vermelha que quando chove mais parece um sangramento tingindo as águas antes azuis, das poucas lagoas que ainda restam, alteração macabra de um cenário que sendo parte do complexo lagunar e área de aves internacionais em rota migratória, compreende esse cenário áreas de preservação permanente, dentro da unidade de conservação Apa de Canoa Quebrada, dentro da zona costeira, o maior parque arqueologico do Ceará, território de povos tradicionais e portanto deveria ser altamente protegido.
Lamentamos viajar na contramão da história, onde criamos leis, e ao mesmo tempo não as aplicamos! Por quê?!
A empresa aos poucos vai ganhando espaço diante da passividade, do silêncio da comunidade, dos profissionais, da impunidade campeante diante dos fatos, e deixam que palmo a palmo o seu território seja reduzido, seu meio de vida destruido e sua cultura ser desarticulada.
Obviamente há um jogo de poder! Fala-se de produçao de energia limpa, mas o processo da instalação dessa energia se deu de forma suja, situado dentro de Unidade de Conservação, obra de grande impacto, fracionaram os parques para dar idéia de obra pequena e de pequeno impacto, pois os devidos estudos de impacto não foram realizados e o que vemos hoje são consequências da ausência dos estudos, e quem sabe mais o que vira? Que tipo de materiais foram utilizados ao longo dessas obras, que acompanhamentos tiveram? Socioambientalmente o que representa a quebra dos costumes e as alterações no ambiente pra essa região? E pra esse povo?
Os moradores do Cumbe estão ficando acuados! Não podem ter acesso ao cemitério, não podem ir até as lagoas, não podem pescar no mar e ir à praia, não podem visitar seus sítios arqueológicos, não podem andar nas dunas. Os profissionais que vivem do turismo da pesquisa não podem levar seus turistas pra ver nem tomar banho em lagoas, não podem levá-los pra conhecer o cemitério centenário, não podem mostrar os sítios arqueológico. Os pesquisadores não podem nada! Os alunos nao podem nada! A comunidade do Cumbe não pode nada! ATÉ QUANDO GENTE ?
O Cumbe e um laboratório vivo e a céu aberto! É território nosso!!! Indignação..gente....!!! Isso que vem acontecendo com o Cumbe é massacre cultural! POR QUE FICAR CALADO?
Valéria Oliveira –Especialista em Gestao Ambiental, Bacharel em Direito.
E o Pior de tudo é a sensação de não ter força - politica, financeira, juridica - para impedir essas ações! Chega a doer!
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